Frase

"A Revolução Francesa começou com a declaração dos direitos do homem, e só terminará com a declaração dos direitos de Deus." (de Bonald).
São Paulo, sábado, 18 de agosto de 2012

A cortesia francesa

Autor: Paulo Roberto Campos   |   09:48   1 comentário



Como temos tratado aqui sobre a cortesia (ou a falta dela), permita-me contar algo pessoal para exemplificar a respeito do tema.

Numa recente viagem a Paris (a primeira em minha vida), preparei-me e fui “escudado” para receber todo tipo de “alfinetadas”, descortesias, indiretas, diretas, “patadas” etc., pois — era o que eu ouvia aqui no Brasil —, “na atualidade, em geral o francês é ranzinza e trata mal todo mundo”. Um engano! Fiquei muitíssimo surpreso, e encantado, ao encontrar o oposto do que ouvia. Encontrei os franceses extremamente amáveis, manifestando suprema cortesia em atender, em dar informações, até pormenorizadamente, a um estrangeiro como eu. Poderia dar vários exemplos do bom trato recebido e das boas maneiras que presenciei.

Se o francês foi ranzinza (ou ainda o é), ele não manifesta sua “ranzinzice”. A gentileza impera. Não sei se posso generalizar, e nem sei se a França inteira é assim. Nem estou seguro para dizer que a França foi ranzinza e que agora mudou. Mas o testemunho que eu dou é que, atualmente, o parisiense apresenta-se muito cortês. É a impressão que tive nos inúmeros contatos com a gentileza na “Cidade Luz”, não presenciando grosserias ou indelicadezas no trato. Na verdade, uma só, mas creio que foi a exceção que confirma a regra.

Mas, é claro, você também precisa tratar os franceses com toda cortesia. Por exemplo, usei aqui o pronome “você” (o que parece compreensível no Brasil, ao me dirigir aos diletos leitores deste blog). Lá o pronome correto no caso é “Vous”, tanto para a Madame como para o Monsieur.

Um exemplo comezinho, mas que me encantou, pois já no primeiro e breve diálogo que tive, logo ao entrar no avião da Air France:

— Bonjour Monsieur!
— Bonjour Madame!
— Bienvenu!
— Merci!

Na França o “Bonjour” e o “Merci” são expressões quase sagradas. Ao entrar em qualquer estabelecimento, por exemplo numa boulangerie(padaria), não se pode — EM HIPÓTESE ALGUMA — ir logo fazendo o pedido da sua apetitosa baguette (pão longo) ou de qualquer outro saboroso petisco. Os franceses não veem isso com bons olhos, julgam uma falta de educação muito grave. Em primeiríssimo lugar, você tem que usar a expressão “Bonjour Madame” ou “Bonjour Monsieur”. Após ouvir o “Bonjour” da outra parte é que se pode então fazer o seu pedido. Isso antes de iniciar qualquer diálogo e em qualquer lugar, mesmo na rua. Do contrário, os franceses, até por cortesia, poderão não dizer nada, mas pensarão: “Esse sujeito é deselegante”. Num português curto e grosso: “Esse sujeito é um “casca-grossa”...

O “Merci” também é indispensável nesse “cerimonial”. Sempre respondido com o “de rien” (de nada) ou “je vous en prie”. Não sei se exagero, mas acho que a expressão que mais ouvi em todos os lugares de Paris foi o “Merci”. Em segundo lugar, o “Bonjour” e em terceiro o “Pardon, Monsieur”, “Pardon, Madame”.


Aqui abro um parêntesis: Alguém poderia objetar que isso (o modo de cumprimentar) é uma coisa insignificante que não modifica uma sociedade.

— Responderia que APARENTEMENTE é uma coisa insignificante, mas que essa simples, pequena e fácil manifestação de cortesia, de respeito pelo próximo, pode mudar a história de uma pessoa, de uma família, de um país. Um exemplo: Se alguém, ao cruzar com um vizinho, não o saúda com o“Bom dia, senhor fulano”, poderá deixá-lo magoado. Ademais, seu filho seguirá o exemplo, imitando sua descortesia com os colegas. Você poderá ter contribuído assim para que o filho seja grosseiro. A família poderá viver em atitudes grosseiras e em conflitos uns dando “patadas” nos outros. Seu filho quando crescer, o que será para a sociedade e para o País?

* * *

Fechando o parêntesis e encerrando esse post: Ainda não encontrei resposta para uma questão: Será que tendo perdido o trato delicado a França ficou ranzinza, mas que atualmente está reencontrando a cortesia perdida? Com saudades da “douceur de vivre” (doçura de viver) quotidiana na França do“Ancien Régime”? Como vimos no post anterior ( Em busca da cortesia perdida! ), na “Belle Époque”,ocorreu esse “reencontro” com algo do estilo de vida elegante e cortês do “Ancien Régime”.


De passagem, falando de “Ancien Régime”, não resisto em inserir aqui um comentário de Talleyrand sobre essa época anterior à Revolução Francesa: “Ceux qui n'ont pas vécu avant 1789, ne connaissent pas la douceur de vivre" (“Aqueles que não viveram antes de 1789, não sabem o que é a doçura de viver”).

* * *

A propósito da impressão (sobre o reencontro com a cortesia) que trouxe da “Cidade Luz” — que muito me marcou, mas para a qual não encontrei resposta — pesquisei em alguns textos que guardo e deparei-me com uma conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira — um grande admirador da“Douce et Belle France” — na qual ele tece interessante comentário sobre o país. Aqui ofereço um trechinho que selecionei para nossos leitores:
Quadro exposto no Musée Carnavalet, em Paris (Foto PRC)

“A França, em determinado momento, inspirou a cortesia universal. E, fora de dúvida, ela é a nação da cortesia. A França de hoje não é o que desejaríamos, mas ficou pairando no mundo uma ideia de que seria incomparavelmente melhor se a França inteira vivesse isso [estimulando a cortesia]. Ela seria mais ou menos como a madeira aromática que se coloca numa sala: vai perfumando, perfumando, perfumando, sem se destruir”.

1 comentários:

Meu amigo,
Vou a França constantemente, por puro prazer, e nunca fui maltratado por um francês e lá, só falo o inglês, as palavras mágicas, bonjour e merci são doces em minha boca.
Nunca deixei de ser atendido, com sorrisos de cortesia e demonstrações de afabilidade.
É um povo agradável, educadíssimo, e se após o Bonjour você disser que precisa de ajuda eles desviam seus caminhos e o fazem, deliciosamente prestativos.
Na região central de Paris, onde estão milhares de turistas, existem algumas pessoas mais nervosas mas, se você perceber, não são francesas, são de outros países e tem bares, restaurantes e vendas de artigos para turistas, aí não conta porque eles também vivem cercado de pessoas que não praticam este belo costume do bem viver, incluindo muitos brasileiros.
Abraços
Jones